Hoje é domingo. Em meu imaginário, domingo é dia de feira

Domingo é dia de feira. Dia de ser acordado com o barulho dos ferrinhos que dão sustentação às barracas de roupas e afins.

Desde criança, quando meu corpo físico estava no km 100, domingo tem cheiro de feira. Quando ouço “trem das cores” de caetano, no trecho em que diz: “a seda azul do papel que envolve as maçãs”, cantarolo com a alma passeando pelas ruas dominicais, ainda sem calçamento, do meu pequeno-grande povoado.

A feira sempre foi um templo; um lugar mágico onde as “novidades” chegavam pra nós: lá, comprávamos os livros didáticos, os discos de vinis que eram lançamento na tv, as roupas que eram moda nas vitrines da capital, as uvas – raras – para serem ofertadas logo mais à noite, nas missas…

Foi lá que ouvi cantadores e trovadores; comprei bonecos originais do mestre vitalino; uma camiseta do calvin; os tênis montreal de silvio santos ou os kichutes para a educação física; a barraca de “seu júlio” ainda hoje tem um cheiro único: é um cheiro que só existe lá naquelas bancas enormes que, de tudo um pouco, já fazia as vezes do mercado livre. sempre foi o espaço de encontro; lugar terapêutico para aliviar as tensões e dividir as angústias, mas, também, de celebrar as vitórias: “fulano foi embora para tal lugar” ou “já casou?”…

A textura dos alimentos expostos, as cores das roupas dispostas muitas vezes em lonas no chão; os quadros dos santos; as bancas das ervas e incenso; as guloseimas com sucos de frutas da época. tinha também aqueles que madrugavam e se escondiam para não serem vistos comprando “coisas da feira”…

Uma feira enorme que durava o dia inteiro. começava na madrugada e só se dissipava com o final do dia onde a praça voltava a ser praça e deixava de ser o terreno fenomenológico da existência dos povos da minha região.

Era lindo ver as pessoas, sempre bem-vestidas, com seus trajes coloridos, bem passados e cheirando a alfazema: as mulheres, com seus panos na cabeça, tal como coroas de rainhas e os homens, com seus chapeus, de couro ou de palha, também como constitutivo da indumentária real do “dia-de-feira”…

A alegria das crianças ao comprar o sorvete-com-gosto-de-ki-suco naquela máquina retrô (linda!) almejando terminar para comer a casquinha ou a vivacidade das senhoras ao escolher a melhor carne de sol.

Sim.

A feira, mesmo sendo no dia-do-senhor, não é, na verdade, uma atividade puramente econômica, mas um lugar de encontro, do outro, da partilha, da lida, da força e da comunidade.

É um ritual.

Estar no 100 e não ir na feira é como ir a salvador e não sentir o cheiro do mar…

Queria te pedir uma coisa: “já que tu vai lá pra feira, traga de lá, para mim, água da fulô que cheira, um nuvelo e um carrim…”

Saudades de tantos e tantas feirantes…

Marcos Cajaíba

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